domingo, 4 de setembro de 2011

DEUS E EU

Obrigada, Senhor, pelas sempre novas oportunidades de recomeçar, de refazer um novo certo agora, por compreender os meus erros, as minhas imperfeições e me dar sempre esta nova chance. Hoje só tenho-vos a dar graças. Amém.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

ÓCULOS

Às vezes dá a impressão de ter feito tudo errado, de ter escrito tudo errado. Vontade de acabar com tudo, mesmo antes de entender. Mesmo antes de saber se um dia terei entendido. Continua sendo solitário demais andar por entre as gentes. Dá raiva de Deus, que é mais forte que o fogo. Dá raiva de mim, que sou mais fraca que o pó da terra de que sou feita. Tão forte a terra. Tão forte a água. E o ar. Algumas vezes penso que somos mesmo feitos é dos

quatro elementos básicos, que o homem insiste em transformar, destruir. Uma linha foi saltada. Uma linha não preenchida. Diz-me que algo neste texto não me pertence. Ainda que uma linha. Tanta coisa pode ser escrita numa linha. Estou sem meus óculos

e as letras se misturam, se sobrepõem, impedindo que eu veja o que eu mesma escrevo. Escrevo às cegas. E outra linha saltada. As linhas da clareza. Cada vez que salto uma consigo me situar melhor na minha própria escrita perdida. Deve haver um Deus preenchendo as linhas saltadas com os óculos que por preguiça e/ou comodismo encostei na escrivaninha. Coloco os óculos. Até a minha letra fica mais legível. Releio o texto. Dá vontade de apagar quase tudo e deixar só as linhas saltadas. Foi o que de mais genuíno o texto pariu. E é com elas que eu deixo você.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

PRIMEIRO DESENHO


sexta-feira, 15 de julho de 2011

HOLOSFRENIA

A liberdade amou a lei
que também amou a liberdade
A liberdade sentiu raiva da lei
e disse sai
A lei também sentiu raiva
e disse sai você
A liberdade bradou
você tem tudo e eu não tenho nada!
A lei contrapôs
quem não tem nada sou eu!
Você tem é muita pena de si mesma!
Você está falando de si mesma, não queira se machucar!
Eu não tenho medo de me machucar, você quer me abandonar, é isso?
Não, você quer me abandonar?
Também não.
Sabe, eu sempre achei que você tivesse tudo, porque você tinha tudo o que eu não tinha e queria pra mim e você achou que eu tivesse tudo porque...
Shhh... nenhuma de nós duas nunca teve nada até conhecer uma à outra.
Eu sou eu e você é você e esta é a solução.
E a verdade (não mais) dói.

sábado, 18 de junho de 2011

SOBRE A ARTE

A arte é constituída de filhos paridos para destinatários certeiros. Se não há destinatários, a arte fica gerando e nutrindo a si mesma, mas não nasce. Não acontece a maiêutica. Acho que foi disso que Clarice falava quando criou Macabéa, que morreu grávida de futuro - solidão, falta de destinatários. Feliz dela, que, ainda assim, conseguiu parir uma história. Feliz de mim, que ainda assim, vez ou outra, consigo parir bilhetes ou um parágrafo. Como o de Macabéa, o desejo de toda arte é o de ser estrela. E não há por que parir, se não existe ninguém olhando para o céu. Quem virou estrela foi Clarice - quem é estrela agora sou eu.

"Para que eu chore, é preciso que vós choreis também."
Nicola Boileau

"Só a arte permite a realização de tudo o que na realidade a vida recusa ao homem."
Goethe

terça-feira, 24 de maio de 2011

COMO

Estou cansada, exausta, de me esforçar para simplesmente ser eu. Parece para as outras pessoas ser tão fácil, tão fluido, os dias são leves e o que exaure é o trabalho, a rotina. Em mim o que exaure são os poros, a pele, é o dever de exercitar o hábito de ser quem eu sou, de manter uma linha reta sob os meus próprios pés e caminhar serena e firmemente sobre ela, venha o que vier. É pesado suportar os sopros, imagine então os vendavais. Dá vontade de me esconder num cantinho secreto, quentinho e escuro, abraçada a alguém que entenda o que eu digo e nunca mais soltar. Mas não, quem eu sou quer abrir o peito e enfrentar a tempestade e o que quer que venha, quer fazer da linha reta a direção, do horizonte o destino e do medo a companhia em carcaça. Quem eu sou, mesmo cansada, assustada, ansiosa, vai continuar lutando e um dia chegará - sorrindo, tremendo, com as mãos geladas, buscando aquecimento e esteio, vai. Porque, mesmo com toda dificuldade do mundo, quem eu sou, parida de mim mesma, a cada novo instante, sofregamente, enfim, é.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

SABE-SE LÁ

É engraçado como vocês sumiram na hora do maior desespero, na hora do grito mais alto, na hora da corrida mais longa. É interessante como todo mundo ficou mais ocupado, silencioso, como os assuntos em comum não são mais nada comuns, o cotidiano já é coisa desconhecida e a amizade virou item relapso. De fato, quase como disse Pessoa, de todos, restaram uns poucos. Parece que o desespero criou nós nos elos, o grito espalhou medo e a corrida, só por vislumbre, já proferiu cansaço. A história construída antes não foi capaz de deter a lenta e profusa implosão dos vínculos. E eu fiquei aqui, tentando juntar a poeira e montar dela qualquer tipo de mosaico que reconstruísse um texto, uma crônica, uma dignidade de oi, tudo bem com vocês, comigo a vida continua, tombada na falta que vocês têm deixado, ou mesmo um resignado adeus, até mais. Eu não fui embora, só parei para respirar. Profundamente respirar. Mas pensei que o ar era o mesmo que aí. Não era? Na conversa entre os bois, fui eu o que subiu a colina. E, depois da derrocada, cá estou - de patas estendidas - em digno olá; em digno adeus; em digno até.




"Tem que ter coragem de olhar no fundo dos olhos de alguém que a gente ama e dizer uma coisa terrível, mas que tem que ser dita. Tem que ter coragem de olhar no fundo dos olhos de alguém que a gente ama e ouvir uma coisa terrível, que tem que ser ouvida.... A vida é incontornável. A gente perde, leva porrada, é passado pra trás, cai. Dói, ai, doi demaais. Mas passa. Está vendo essa dor que agora samba no seu peito de salto agulha? Você ainda vai olhá-la no fundo dos olhos e rir da cara dela. Juro que estou falando a verdade. Eu não minto. Vai passar."
(Caio Fernando Abreu)